Fundos de investimento controlam cada vez mais jornais dos Estados Unidos

Jornal ANJ Online 
28 Agosto 2019


Os fundos de investimento consolidaram sua posição entre os grandes proprietários de jornais dos Estados Unidos em meio às dificuldades financeiras enfrentadas pelas organizações jornalísticas, que correm em busca de adaptação à disrupção digital no negócio de mídia.

No mais recente movimento, o fundo de private equity Fortress Investment Group, pertencente ao banco japonês Softbank, controla a New Media Investment, matriz da GateHouse Media, que comprou a Gannett por cerca de US$ 1,4 bilhão entre dinheiro e ações. A fusão abre caminho para a criação de uma companhia gigantesca com 263 jornais lidos por mais de 145 milhões de leitores nos Estados Unidos.

Outra empresa de private equity, a Alden Global, possui 60 diários norte-americanos, lembra Merja Myllylahti, co-diretora do Centro de Pesquisa de Jornalismo, Mídia e Democracia (JMAD) da Auckland University of Technology (AUT), da Nova Zelândia. O fundo de hedge Chatham Asset Management, por sua vez, é um dos maiores acionistas da McClatchy, outro grande grupo de mídia dos Estados Unidos, que edita jornais como o Miami Herald, o Sacramento Bee e o Minneapolis Star Tribune.

A tendência já havia sido detectada por Penelope Muse Abernathy, que em seu relatório “The Rise of the New Media Baron”, de 2016, observa que “fundos de private equity, fundos de pensão e outras parcerias de investimento mudaram rapidamente para adquirir centenas de jornais em dificuldades”. Essas aquisições vêm acompanhadas de drásticas reduções de custos, que quase sempre envolvem profundos cortes operacionais e demissões.

As empresas de fundos de investimento, em particular os private equity (caracterizados por aporte privado de investimentos, com base em fundos específicos, em empresas já consolidadas), não estão apenas fortemente envolvidas com a reorganização dos setores de mídia nos Estados Unidos, mas também em outros mercados, diz Merja Myllylahti. É o caso do grupo editorial alemão Axel Springer, que está no caminho de deixar os mercados de ações para se tornar uma empresa privada com a ajuda de uma private equity.

A empresa norte-americana KKR se tornou a maior acionista do publisher alemão Axel Springer, que controla empresas de mídia digital e B2B nos Estados Unidos, entre as quais o site de informação sobre tecnologia Business Insider. A KKR pagou 2,9 bilhões de euros (US $ 3,2 bilhões) por uma participação de 43,54% na empresa alemã. Uma vez privada, a Axel Springer, liderada pelo seu CEO, Mathias Doepfner, espera ganhar maior liberdade para construir seu portfólio digital e buscar mais aquisições.

Além disso, o grupo de private equity BlackRock – maior gestor de recursos do mundo – adquiriu recentemente uma participação de US$ 875 milhões na Authentic Brands, que possui a revista esportiva norte-americana Sports Illustrated, entre outras marcas. Em abril deste ano, a Univision vendeu o Gizmodo Media Group para o grupo de private equity Great Hill Partners.

Embora os negócios nos setores de mídia, telecomunicações e tecnologia dos Estados Unidos estivessem em uma baixa de dois anos no primeiro trimestre deste ano, os números do segundo trimestre subiram, de acordo com a PricewaterhouseCoopers (PwC). No segundo trimestre, houve 159 acordos financeiros nos setores de mídia e telecomunicações norte-americanos, com valorização de pouco menos de US$ 37 bilhões. A PwC observa que as empresas de private equity estão presentes em 46% dos negócios anunciados.

Toda essa movimentação é alvo de atenção dos pré-candidatos à presidência dos Estados Unidos. Em artigo no site da Columbia Journalism Review (CJR), da Escola de Jornalismo da Universidade Columbia, o senador democrata Bernie Sanders, por exemplo, disse que a imprensa vive mergulhada nos problemas impostos pelo duopólio de Google e Facebook e, ao mesmo tempo, “conglomerados empresariais e abutres de fundos de hedge compraram e consolidaram jornais locais sitiados e cortaram suas redações”.]

“O jornalismo real é diferente da fofoca, dos comentaristas e do clickbait que dominam as notícias de hoje. O jornalismo real, nas palavras de Joseph Pulitzer, é a minuciosa reportagem que ‘lutará por progresso e reforma, nunca tolerará injustiça ou corrupção, [e] sempre lutará contra demagogos’”, escreveu Sanders. Quando falta jornalismo, afirmou o senador, crimes como a fraude hipotecária passam despercebidos e impunes, levando os Estados Unidos a uma crise financeira devastadora que destruiu milhões de vidas de americanos.

“O jornalismo real requer recursos significativos. Uma razão pela qual não temos jornalismo real suficiente na América agora é porque muitos estabelecimentos estão sendo destruídos pelas mesmas forças da ganância que estão saqueando nossa economia”, disse o democrata. Segundo ele, a fusão da Gannett com a Gatehouse Media consolidará centenas de publicações sob o controle de uma megacorporação e reduzirá US$ 300 milhões em “sinergias” – que muitas vezes, destaca Sanders, é a palavra corporativa para demissões.

“Precisamos reconstruir e proteger uma imprensa diversa e verdadeiramente independente para que jornalistas de verdade possam fazer os trabalhos críticos que eles amam e que uma democracia funcional requeira”, assinalou o pré-candidato democrata à Casa Branca.

Leia mais em:
https://www.inma.org/blogs/research/post.cfm/private-equity-groups-are-the-new-media-baronshttps://www.cjr.org/opinion/bernie-sanders-media-silicon-valley.phphttps://www.reuters.com/article/us-axel-sprngr-m-a/kkr-becomes-axel-springers-biggest-shareholder-idUSKCN1VG1DKhttps://www.axelspringer.com/en/press-releases/final-acceptance-rate-for-kkr-offer-reaches-42-5-percent

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