Escrito por Nathália Carvalho
Assim como no ano passado, quatro executivos de grandes jornais brasileiros se reuniram a fim de compartilhar e discutir questões relacionadas ao momento dos impressos diante do mundo digital. O evento que recebeu esses profissionais foi o Seminário Internacional de Jornais, organizado pela International News Media Association (INMA), e realizado em São Paulo nesta semana. Diferentemente do que foi discutido em 2013, Estadão, Folha, O Globo e Zero Hora falaram mais sobre mudanças do que de investimento. Além disso, a discussão teve um ponto em comum: os quatro veículos relataram mudanças na estrutura de suas redações para se adequarem ao novo cenário.
Como os grandes jornais estão se reinventado?
Muito se fala sobre crise nas empresas jornalísticas, que atinge também o meio impresso. Nos últimos anos, o mercado tem acompanhado o enxugamento das redações. O que não fica muito claro é como esses veículos se organizam para passar por mudanças sem tantos impactos e, o principal, como distribuem seus jornalistas entre as produções nas diversas plataformas.
Ascânio Seleme, Sérgio Dávila, Roberto Gazzi e Marta Gleich (Imagem: Studio 3X)
Foi partindo desse ponto que o editor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, falou sobre os bastidores do que acontece no diário. “A mesma equipe que há dez anos fazia o impresso tem, hoje, de fazer online, mobile, aplicativos, seminários e outros. O mesmo grupo, só que com muitas outras funções agregadas. Não tem sido fácil”. Para ele, mesmo com o modelo ainda sendo questionado, a Folha mantém sua redação integrada. Ou seja, os jornalistas fazem conteúdo para todas as plataformas. Dávila explicou que o impresso, por ora, continua sendo tratado com primazia. Não por cultura, mas pelo financiamento. “Pensamos que, para o bem e para o mal, primeiro o impresso e depois o digital”.
O executivo acredita que o mercado de notícias agregou à produção de conteúdo a função de curadoria. “Na internet, tudo é manchete. São muitas informações e o nosso papel é dizer o que é prioridade naquele último intervalo de tempo”. Ao falar sobre receita, o editor-executivo revelou que a Folha não aceita a promiscuidade entre redação e publicidade, mas pondera que as áreas não precisam ser antagônicas. “Temos que ter em mente que a transparência com o leitor é essencial. Então, conteúdo patrocinado não é feito pelos nossos jornalistas e é bem identificado como tal no impresso”. Em relação à inovação, afirma que as empresas precisam criar célula para cuidar exclusivamente do assunto.
Quem representou o Estadão foi o diretor de desenvolvimento editorial Roberto Gazzi, que revelou o processo de mudança na empresa. “O modelo que usávamos anteriormente prejudicava a tomada de decisão. Precisou mudar bastante. Investimos em treinamento para dar conta de uma grade de fechamento que começa às 5h”. Atualmente, a organização do Estadão tem um centro de comando. “Deixamos de ser apenas produtores de conteúdo para ser, também, de tecnologia”.
De acordo com Gazzi, o momento de “angústia” é compartilhado por todas as redações brasileiras. “Neste momento, estamos tentando descobrir se a velocidade das nossas mudanças é correta. Tudo isso para tentar financiar o futuro e continuar cumprindo nossa missão, que é fazer bom jornalismo sempre”.
Em O Globo, a mudança foi mais radical, segundo o diretor de redação Ascânio Seleme, já que a rotina dos jornalistas se adaptou à lógica do consumo de informação. “A redação deixou de focar prioritariamente o impresso e passou a se dedicar à edição contínua em diferentes plataformas”, explicou. Para que isso fosse possível, os editores passaram a entrar mais cedo, às 7h. A medida permitiu que o jornal pudesse ter a primeira reunião de pauta às 8h, a fim de definir os conteúdos das plataformas digitais.
A mudança refletiu, também, nos cargos. Abaixo da direção, surgiram quatro editores executivos, que ficam na mesa de comando. Esses profissionais, que alternam seus turnos de trabalho, orientam os editores do digital e as equipes de produção, interfaces e audiovisual. “Hoje, estamos no ritmo da notícia. Entendemos que o ponto de referência do nosso sistema é o site. Ele é o coração da nossa engrenagem”.
Veiculado no sul do país, o Zero Hora promoveu diversas ações neste ano, sobretudo em comemoração aos seus 50 anos. O mais interessante das mudanças está na redação. A diretora de redação Marta Gleich explica. “Integramos a nossa equipe há alguns anos. Então, todos faziam off e online. Neste novo momento, nossa ideia é impulsionar o digital”, disse. Para isso, o ZH tem, atualmente, 1/3 de seus jornalistas dedicados ao digital. O resto continua no modelo anterior. Ou seja, fazendo conteúdo para todas as plataformas.
Parecida com a estratégia de O Globo, Zero Hora também se adaptou aos horários dos leitores, o que resultou em novos deadlines dentro da redação e jornada de trabalho diferenciada. “Enquanto os jornais continuam quadrados, tem gente correndo por fora e criando novos conceitos e modelos. Em ZH, estamos abraçando profissionais de outras áreas, como um economista que foi recém-contratado para trabalhar com estatística na redação. A questão é que outros players estão investindo em algo parecido com o jornalismo e atendendo o nosso público. O que vamos fazer? Vamos seguir no nosso modelinho?”, questionou a executiva.
Fonte: Comunique-se.